sábado, 7 de abril de 2007

A Semiótica do Amor

"Não contemplava mais uma esquisita combinação de flores; via agora, aquilo mesmo que Adão vira no dia de sua criação, o milagre do inteiro desabrochar da existência, em toda a sua nudez". (Aldous Huxley, As Portas da percepção)
O que Huxley descreve é sua experiência com mescalina. Mesmo assim é possível perceber como a experiência descrita lembra a sensação de se estar apaixonado. Quando estamos amando tudo parece ter mais cores, uma flor nunca é apenas uma flor, tudo é muito mais intenso. O olhar recupera uma parcela da inocente percepção da infância. O oposto também ocorre. Basta lembrarmos dos "fóras" que tomamos: de repente tudo ficou meio acinzentado, a existência perdeu sua importância, ficamos triste por um dado momento e tal...
A mescalina e o LSD anulam quase que completamente a preocupação com o tempo e o espaço. Esta despreocupação, muitas vezes, também sente quem está apaixonado.
O fato da garota no desenho estar deitada é a prova de sua despreocupação com o tempo e o espaço. Seu olhar reflexivo denota: só há a preocupação com a existência e o significado.
Mas, afinal, ela está apaixonada ou tá doidona de mescalina?
Olha, pelo insólito demônio da fonte, eu aposto na mescalina. E vocês?
A percepção se altera e aquilo que ela observa brilha com luz própria, luz interior - o puro ato de existir. O que ela nota é a existência pura e simples da pomba. A primeira apreensão sem julgamentos, sem reflexão. Exatamente o que Peirce chamou de Primeiridade.
Um momento depois, ela toma consciência da existência da pomba, e reage diante dela. É a Secundidade.
A reflexão leva a garota finalmente à compreensão (Terceiridade) de sua própria realidade. Um mundo de grande beleza se revela. É o estado de Beatitude que Huxley menciona em seu livro. A compreensão nos aproxima de Deus - veja os anjos atrás dela.
O ciclo se fechou e ela percebeu: o entendimento do mistério da vida (uma experiência quase mística), os átomos que deram origem a todo o universo e que também estão presentes naquela pomba.
Existência - Consciência - Beatitude. (Huxley)
Primeiridade - Secundidade - Terceiridade. (Peirce)
...
O homem tem banalizado tudo - inclusive o amor. Transformando-o em algo piegas. Porém, não vamos culpá-lo por isso. Se o ser humano banalizou o amor foi porque nunca o compreendeu em sua totalidade. Faltou-lhe treinar o olhar, praticar a semiótica.
Olhe a sua volta e responda:
Qual de todas as coisas que você vê não é composta por átomos?
Quais destes átomos não se unem por força de atração, energia?
E o que é o amor, senão, impulso, atração, vontade, força, energia?
O amor está em toda parte, mas nós não vemos isso.
Mas, a garota viu!
Ela viu na pomba toda a composição do universo, através de um processo de semiose infinita: um pensamento que puxa outro...uma coisa que puxa outra que puxa outra...

Bem, se você ainda acha que semiótica e amor não tem nada a ver e que duvida que tudo no universo está conectado, saiba o que a mecânica quântica descobriu: "não se pode ter um universo separado da mente".
Acorda, meu irmão! Tá tudo junto e misturado!!!

5 comentários:

José Renato Salatiel disse...

Tatiana, teus insights foram ótimos. Adoro esse livro do Huxley (vc já leu Terence McKenna?)O estado apaixonado, o torpor alucinógeno, o deleite estético, o êxtase religioso e outras catarses cotidianas nos conectam com o que Schelling chamava de Absoluto, o Uno. Toda experiência científica, lógica e racional secciona, dualiza, desconecta sujeito e objeto. É a ordem da razão, da linguagem. A Arte, em Schelling, une o que estava separado.

José Renato Salatiel disse...

(continuando). É o que Peirce chamava de Primeiridade. A relação com Huxley é ótima, mas requer alguns cuidados: primeiridade é mera potencialidade; existência é segundidade e consciência, terceiridade. Você já leu sobre a cosmologia peirciana? Ele retoma o conceito de ágape para falar dessa simbiose com o universo. Isso dá um outro significado para o evangelho de João. Olha só no que a gente foi se meter!!!!!

Roderico P. Franco disse...

Pow eu nem vou opinar muito. O seu blog, o Salatiel e do Diego, são muito "difícieis". Não é crítica; pelo contrário. Conta-se nos dedos gente que escreve assim como vocês. Eu sou popularesco mesmo, paciência; enquanto vcs escrevem sobre o Schelling, eu só consigo escrever sobre o Lula msm. Bom, enfim, o que significa ágape? hauhaua brincadeira

Unknown disse...

Ah, sobre o meu jeito de escrever, q vc gostou: tente, ao invés de deixar tanto "texto junto", deixar um espaço entre os parágrafos.

Como fiz agora, tipo assim, daí fica mais, sei lá, corrido.

Até mais.

Aline disse...

Snif! Ai Florzinha num tenho nem o que falar...Sou suspeita pois adoro
essas suas relações.

Imagem e texto, total sincronicidade...hehehehehehe.

Parabéns, como diz o Zé, está ótttiiimmmo.

Uma alusão à "Mito da Caverna"

Uma alusão à "Mito da Caverna"